sexta-feira, 20 de março de 2009

Misfit

... Silêncio. Luzes. Reflexos. Parece que estou flutuando. As coisas acontecem em câmera lenta. Eu estou na água. Afundando. Tento respirar, como se não soubesse o que aconteceria. A água salgada invade minhas narinas, minha boca. Eu engasgo e começo a tossir quando a água salgada atinge a epiglote. De repente o mundo se enche de ruídos ensurdecedores, tudo volta a se mexer como se quisesse recuperar o tempo perdido. A velocidade, os barulhos, as luzes tudo é atordoante e desnorteante. Debato-me em busca da superfície, braços e pernas se mexendo freneticamente, tentando impulsionar o corpo para cima. Meus movimentos ficam rijos as pontas dos meus dedos se contraem, parece que irei parar a qualquer momento... Eu sorvo a maior quantia de ar que consigo, assim que minha cabeça emerge da água. Neste exato momento de alivio uma onda quebra e me joga novamente para o fundo, sem poder aliviar a falta de ar, tenho que me debater novamente para atingir a superfície e esperar que eu não esteja em alto mar. Várias ondas me jogam para frente e para o fundo toda vez que tento respirar, já não sei há quanto tempo estou nadando, todos os músculos de meu corpo doem lancinantemente. Posso sentir meu coração batendo em cada parte do meu corpo com uma força ensurdecedora que me aliena de tudo ao meu redor, a única coisa importante é conseguir respirar, conseguir pisar em terra firma, parar de bater braços e pernas e ter certeza que não serei tragado por mais uma onda gigante como se eu fizesse parte dela. A medida que meu coração se cala posso perceber as coisas a meu redor, de como luto futilmente , de uma praia a distância, do infinito azul do céu e do mar, de como o meu esforço, de como eu sou insignificante. O ritmo das pernadas e braçadas diminuem, como se meu corpo quisesse me mostrar a verdade da situação, eu morrerei. Vejo a praia novamente. Uma tentativa derradeira, o último esforço, o meu provável réquiem. Aumento a força e a velocidade do nado, meus músculos reclamam do esforço anormal. As únicas coisas existentes são minhas pernas e braços. Não sei a distância da praia, não sei onde estou, não sei que direção estou indo. Só vou. As malditas ondas começam a quebrar com toda força nas minhas costas, a diferença, que agora me jogam contra a areia que esfola minha pele. Toda vez que me levanto uma onda tira meu equilíbrio e novamente me esfrega na areia, mais esforço para conseguir levantar todas as vezes que caio, mais esforço para andar na água com roupas encharcadas. Meu corpo grita de dor, e cansaço. A quantidade exorbitante de ácido lático e adrenalina me deixam completamente alucinado. Só sei que quero sair da água poder ter certeza que não precisarei mais nadar. Que poderei descansar e respirar. Meus joelhos cedem, caio de bruços, vomito e desmaio.
Abro os olhos e me levanto desesperado. Preocupado que ainda esteja me afogando. A claridade me deixa cego por alguns instantes, enquanto as coisas entram em foco, ouço a barulho do mar, e de pássaros, sinto o vento salgado, a areia, o sol e o gosto acre, ácido e salgado deixado na boca pelo vômito e pela água. A praia se mistura com o mar e com o céu no horizonte de ambos os lados. A solidão dessa vista é tão pesada quantos as pedras que formam o íngreme paredão atrás de mim....